Crítica | Trilha Sonora para um Golpe de Estado

Crítica | Trilha Sonora para um Golpe de Estado

Em 1961 aconteceu um protesto histórico organizado pelos músicos Abbey Lincoln e Max Roach durante uma reunião do Conselho de Segurança da ONU. Eles invadiram o local para denunciar o assassinato de Patrice Lumumba, que era o líder do Congo. O documentário “Trilha Sonora para um Golpe de Estado” dirigido e escrito por Johan Grimonprez faz um ótimo trabalho de contar toda a história que motivou esse protesto.

É um tema bastante complexo, mas Grimonprez apresenta uma obra didática. O formato do filme lembra um trabalho acadêmico, incluindo muitas referências bibliográficas. Não por acaso, o cineasta usa trechos de outras obras cinematográficas: “My Country, Africa” de Andrée Blouin, “Congo Inc.” de In Koli Jean Bofane e “To Katanga and Back” de Conor Cruise O’Brien, e memórias em áudio de Nikita Khrushchev, que foi Primeiro Secretário do Partido Comunista da União Soviética de 1953 a 1964.

É importante citar como o governo dos Estados Unidos desde o início da Guerra Fria com a União Soviética criava novas formas de influenciar outros países em um conflito tanto econômico quanto cultural. O Congo é um país rico em matéria prima para muita coisa importante, como por exemplo o Urânio, usado pelos EUA para a construção da primeira bomba atômica (como vimos em Oppenheimer). Dessa forma, os americanos encontraram uma forma de se infiltrar no país utilizando a música negra americana. Dessa forma, muitos artistas foram convocados para visitar o país africano (e outros do continente) com a desculpa de fazer um intercâmbio cultural. O principal deles foi Louis Armstrong, que no período era o embaixador do jazz.

Outro detalhe para se destacar é a independência dos países africanos, pois dessa forma surgiram 16 novos representantes na ONU. Como cada nação representa um voto único, o continente africano ganha uma grande importância dentro das decisões. Assim, tanto EUA quanto União Soviética inventaram formas de influenciá-los e obviamente sem se preocupar com as consequências econômicas e sociais dentro de cada país.

Todas essas informações são muito bem explicadas e contextualizadas por “Trilha Sonora para um Golpe de Estado”, que ainda tem um bônus: usar a música negra americana, principalmente o jazz, como trilha sonora para o documentário. Enquanto acompanhamos uma verdadeira aula de história política do mundo do período da guerra fria, também temos um passeio por performances musicais de qualidade. Além disso, temos depoimentos de muitos artistas como Nina Simone, John Coltrane, Thelonious Monk e do já citado Louis Armstrong.

No final das contas, “Trilha Sonora para um Golpe de Estado” é um documentário essencial para se entender o momento atual. É sempre importante relembrar a história e ver como certos comportamentos de nações poderosas se repetem até os dias de hoje. A escolha do filme de Johan Grimonprez como um dos indicados ao prêmio de Melhor Documentário no Oscar 2025 mostra o quanto a Academia tem uma visão política do gênero e ressalta a importância de obras como essa. O longa-metragem tem um tema denso e complexo, mas em seus 150 minutos apresenta um ótimo apanhado de informações de maneira clara, didática e eficiente.


Uma frase: – Dwight Eisenhower (presidente dos EUA): “O povo do Congo tem o direito de construir seu país.”

Uma cena: O encontro entre Malcom X e Fidel Castro.

Uma curiosidade: O filme estreou no Festival de Filmes de Sundance em 22 de Janeiro de 2024.


Trilha Sonora para um Golpe de Estado (Soundtrack to a Coup d’Etat)

Direção: Johan Grimonprez
Roteiro: Johan Grimonprez
Elenco: In Koli Jean Bofane, Zap Mama e Patrick Cruise O’Brien (narradores)
Gênero: Documentário
Ano: 2024
Duração: 150 minutos

Ramon Prates

Analista de sistemas nascido em Salvador (BA) em 1980, mas atualmente morando em Brasília (DF). Cinema é sem dúvidas o meu hobby favorito. Assisto a filmes desde pequeno influenciado principalmente por meus pais e meu avô materno. Em seguida vem a música, principalmente rock e pop.

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