A Travessia (The Walk)
Em A Travessia (The Walk, 2015) Robert Zemeckis conta a fantástica história real do equilibrista francês Philippe Petit (Joseph Gordon-Levitt). Em 1974, Petit executou uma proeza que o colocou na história: cruzou o imenso espaço vazio entre as duas torres do então recém-construído World Trade Center sem qualquer permissão das autoridades ou equipamentos de segurança.
O ousado e clandestino espetáculo realizado por Petit é fato antigo e notório, acerca do qual já sabemos a conclusão. Todavia, nem mesmo esse conhecimento prévio consegue comprometer o principal atributo do filme. Zemeckis, com sua incrível direção, nos coloca na travessia juntamente com Petit e, literalmente, nos faz perder o fôlego.
Toda a película, assim, é construída em função desse clímax. Em outros filmes esse formato direcionado a um só momento costuma ser superficial ou enfadonho. Em “A Travessia” isso é ainda mais evidente, pois desde antes do primeiro plano se abrir, esperamos ver a proeza de Petit. Zemeckis sabe disso e não tenta enganar sua audiência. Para manter o público entretido até o fim o diretor opta por uma narrativa leve contada pelo protagonista como numa espécie Vaudeville. É por isso que quando Petit é apresentado para nós, na primeira, ele surge contando sua história ao lado do rosto de outra célebre francesa que conquistou Nova York. E a farsa burlesca que Zemeckis desenha ora tem tons de trama edificante, ora de filmes de golpe, ora de história inspiradora de juventude transgressora. Mas a forma lúdica e franca com a qual a farsa é encenada deixa a plateia confortável para se deixar conduzir rumo ao ápice do espetáculo, que tem como palco um picadeiro que é um vazio suspenso a mais de 400 metros de altura.
Gordon-Levitt é um dos mais talentosos e versáteis atores de sua geração (se você duvida, clique nesse link) e conduz o público com extrema facilidade, como se estivéssemos diante de um espetáculo circense ou teatral. Seu personagem, a bem da verdade, não é Petit. Ele é o personagem que Petit encarna em suas apresentações. O bobo da corte. O clown. E é através dos gestos e palavras desse clown que Zemeckis manobra – como um bom mestre do picadeiro – a sua plateia, exagerando no burlesco para tornar crível uma história que, embora real, é evidentemente inacreditável.
A verdade é que a sequência final à qual somos conduzidos justifica cada minuto prévio do filme, tanto em forma quanto em substância.
Em substância, pois, a história da travessia de Petit, além de ser uma metáfora viva do homem se lançando sobre o imenso vazio do mundo, munido apenas de ousadia, habilidade e elegância, e literalmente andando sobre o ar – superando qualquer um que tenha meramente andado sobre a água -, é também a história que se propõe a ser contada. Entramos na sala de cinema para assistir àquela travessia. A história que a antecede é apenas preparação.
Em forma, pois, a qualidade técnica e a extraordinária habilidade com a qual Zemeckis filma a inacreditável sequência de cerca de 17 minutos coloca o espectador diretamente sobre a corda-bamba com Petit. A fotografia hiper-realista, as câmeras de alta definição e o 3D muito bem usado – mais um diretor de Hollywood que está apreendendo a usar bem os recursos dessa tecnologia – mais do que meramente evocar uma sensação, conseguem deixar o espectador verdadeiramente com vertigens. Sim, nós sabemos que Petit não cairá. Mas logo esquecemos disso e passamos a nos preocupar com nós mesmos. O resultado é, sem qualquer exagero, um espetáculo magistral de tirar o fôlego.
Ao fim e ao cabo, ao fecharam-se as cortinas, Zemeckis enfim, de forma sutil e elegante, presta sua saudação ao grande homenageado da noite. Saúda sem saudar. Saúda com o coração. E com profunda singeleza se despede daquele que, demoramos para perceber – pois o diretor esconde bem seu truque até o fim -, é o personagem principal daquele espetáculo. O World Trade Center. Não mais como um símbolo de pesar, dor e morte. Mas como Petit diria, o oposto disso. Vida. A vida que insistentemente desafia às alturas.
Título Original: The Walk
Título Nacional: A Travessia
Gênero: Biografia/Drama/Aventura
Ano: 2015
Duração: 123 min
Diretor: Robert Zemeckis
Roteiro: Robert Zemeckis e Christopher Browne
Elenco: Joseph Gordon-Levitt, Ben Kingsley, Charlotte Le Bon, James Badge Dale, Ben Schwartz e Steve Valentine.
Estou muito interessado em assistir esse filme. Robert Zemeckis é um excelente diretor e sempre está em busca de novas tecnologias para contar uma boa história. Achei seu último filme “O Vôo” apenas ok, mas esse parece ser muito bom.
Esse de fato está bem acima de o Vôo. Rs.