Crítica | Game of Thrones – 6×04: Book of the Stranger
Há momentos no qual você caminha por um campo de morte, e tudo que vê ao olhar ao redor é vida.
Uma das figuras míticas que sempre me atraiu mais no universo de fantástico criado por George R. R. Martin é a do Estranho. Uma figura misteriosa desde sua denominação que conjura apenas nessa predicação um misto de sabedoria e misticismo que povoa nossa mente com simbolismos e visões.
O quarto episódio da sexta temporada de Game of Thrones consegue cumprir com maestria mais uma vez, uma das costumeiras práticas da série de afirmar a polissemia de seus títulos. Book of the Stranger (Livro do Estranho), é a personificação da sabedoria que deveria ser etérea e fugidia. Uma transgressão de si própria. As palavras proibidas daquele que parece ser um transgressor por excelência.
[button-red url=”#” target=”_self” position=””]Aviso de SPOILERS[/button-red]
Os comentários a seguir falam sobre acontecimentos narrados em Book of the Stranger, o quarto episódio da sexta temporada de Game of Thrones.
#GoT (S06E04) – Book of the Stranger
Assim, em mais um esplêndido diálogo – no qual aqueles que tem a honra de contracenar com um inspiradíssimo Jonathan Pryce agradecem por uma rara chance dessas na teledramaturgia – o Alto Pardal parafraseia uma passagem do Livro do Estranho que trata sobre o ato de caminhar em cemitérios, olhar em volta e diante da imagem da morte, encontrar novas respostas para a sua vida. Nada seria capaz de simbolizar com tamanha força o momento da narrativa no qual os personagens se veem enterrados.
O próprio Alto Pardal, usa de sua narrativa pessoal – não por acaso, evocando um misto de elementos das histórias de São Francisco de Assis e Jesus Cristo a um só tempo – para sintetizar o desespero e a dádiva libertadora que é vivenciar uma morte em vida. Exatamente como se dá com Jon Snow, nesse ponto de forma bastante literal, que é surpreendido pela chegada de sua meia-irmã Sansa de quem há muito ele havia se separado. Da mesma forma se dá com Theon Greyjoy e seu retorno doloroso para casa, e com a épica cena de encerramento do episódio que coloca Daenerys Targaryen mais uma vez em seu merecido centro das coisas, renascendo em toda sua majestade.
A morte, enfim, ronda a todos. Afinal a sombra do Inverno paira ameaçadora sobre cada um, e cada movimento de Game of Thrones agora não poupa esforços no sentido de, mais do que nunca, preparar exércitos, posicionar as peças, para lutar a grande batalha que está por vir. E esse grande jogo tem se organizado a partir de núcleos narrativos bem demarcados, e com propósitos que já se delineiam, os quais vamos analisar um pouco a seguir.
Castle Black
Em Castle Black o eterno Lorde Comandante da Patrulha da Noite – um título que por mais tenha rejeitado, para não se deslocar de Jon Snow, como uma maldição – enfim reencontra Sansa Stark. Trata-se da primeira vez que dois dos filhos – pai é quem cria, não é mesmo? – de Ned Stark se reencontram desde o início da série, então, podemos marcar isso como um evento de grandes proporções.
Jon Snow, ainda preso na fase de negação da jornada do herói, quer apenas deixar aquela vida que o levou mesmo a morrer. Mas Sansa Stark não sofreu tanto para ser apenas mais um peão nesse jogo. Ela de fato parece ter apreendido uma coisa ou outra sobre os jogos do poder, e não hesita em usar sua influência sobre seu meio-irmão, incitando-o à guerra.
A provocação de Ramsey através de uma carta na qual ele avisa que tem Rickon Stark como refém, serve finalmente a convencer o ainda hesitante herói. Ele irá lutar e honrar o nome de Ned Stark, salvar seu meio-irmão, vingar e proteger Sansa e, o mais importante, recuperar sua casa e lugar da família Stark como defensores do Norte. Em algum lugar, eu imagino, Catelyn Stark deve se revirar em sua cova pelo bastardo que ela tanto desprezava ser o único capaz de recuperar a honra e o poder da casa Stark.
Cabe o registro ainda, nesse núcleo da trama, do encontro entre Ser Davros Seaworth, Brienne de Tarth e Melisandre. Brienne – que assim que adentra em Castle Black com Sansa atrai para si olhares dos mais lânguidos de ninguém menos do que o selvagem Tormund Giantsbane, em um prenúncio de romance que de longe pode vir a ser um dos mais interessantes da série – com sua típica e encantadora sutileza revela à Melisandre e Ser Davos que executou Stannis pela morte de Renly. Aparentemente é a forma de antigos rivais deixarem o passado para trás e firmarem novas alianças para o futuro, afinal, agora todos eles servem aos Stark. E a batalha será dura, já que, aparentemente, Ramsay possui mais do que o dobro dos homens que Jon Snow tem a sua disposição.
Ou assim ele pensa, pois o sempre ardiloso e indecifrável Lorde Petyr ‘Littlefinger’ Baelish, parece ter conseguido o apoio de algumas tropas dos Cavaleiros do Vale com o jovem Lorde Arryn para ajudar os Stark a retomar e proteger o norte. Sempre é bom rever Aidan Gillen em cena, e basta mesmo uma cena para ele e seu personagem marcarem espaço no episódio, como símbolo que é de tudo que Game of Thrones tem de melhor.
As Ilhas de Ferro, Porto Real e Meereen
Nas Ilhas de Ferro, Theon é recebido de forma não muito calorosa por sua irmã Yara Greyjoy. Ela acha bastante conveniente – e não sem razão, considerando o histórico das famílias em Westeros – que Theon tenha retornado logo após a morte do pai deles Balon. Mas Theon logo a tranquiliza e afirma que irá apoiá-la a se tornar a primeira mulher a reinar nas Ilhas de Ferro. O papel de Theon na trama parece ser bastante claro também: retornar a seu outro lar e ajudar Jon Snow a retomar Winterfell com o apoio dos Ironborn.
Em Porto Real os gêmeos Lannister enfim parecem conseguir retornar ao poder. Após convencer os Tyrrel de que ambos querem libertar Margaery das garras da Fé Militante, Cersei e Jamie conseguem um exército para enfrentar o Alto Pardal. Mais uma mobilização de exércitos em Westeros. Mais uma preparação par um embate maior. Mas esse deve ficar para a próxima temporada, imagino eu.
Quanto a Meereen, vale a menção de mais uma vez Tyrion dando uma aula de como se lidar com o poder. O conselheiro da rainha quer firmar uma espécie de trégua com os Mestres da Baía dos Escravos e assim anular os Filhos da Harpia e garantir, através da diplomacia, o controle de Daenerys sobre a cidade que dominou. O imp segue crescendo como um grande estadista e, se há alguém naquele mundo capaz de costurar acordos entre inimigos tão irreconciliáveis contra a ameaça dos White Walkers, esse alguém só pode ser ele.
Vaes Dothrak
Mas é mesmo em Vaes Dothrak que o grande ponto alto e épico do episódio se desenvolve. Jorah e Daario seguem aos tropeços em sua missão desesperada para libertar sua Khaleesi. Mas é claro, como convém a Daenerys Targaryen, ela não espera para ser libertada como uma vítima indefesa. Daenerys toma aquilo que é seu.
Com a ajuda de algumas Dosh Kaleen e dos seus fieis guerreiros, Daenerys arma uma emboscada para o atual Khal e seus principais guerreiros no templo das Dosh Kaleen. Ela ateia fogo à estrutura e garante que eles fiquem aprisionados com ela lá dentro. Seu sangue Targaryen a protege das chamas. Daenerys, assim, renasce mais uma vez em meio às chamas, do alto de toda a sua beleza e esplendor nu, sobre os corpos calcinados de seus adversários.
Não há como negar a majestade intrínseca à personagem, e o ótimo trabalho de Emilia Clarke ao lhe emprestar toda a força que uma personagem como essa para ser minimante convincente precisa. Agora Daenerys também é a senhora dos Dothraki e tem mais homens em suas fileiras – ou melhor dizendo, uma das melhores e mais mortais cavalarias do mundo – para lutar a seu lado para recuperar o trono de ferro.
Recomeços e outras Jornadas
Book of the Stranger parece ser de fato dado início a um novo arco nessa sexta temporada de Game of Thrones. O primeiro arco encerrou-se com o retorno de Jon Snow. Agora um segundo arco se inicia, com a movimentação de novas peças e a formação de novas alianças.
De um lado Daenerys parece já ter se estabelecido como senhora dos Dothraki, mas ainda falta ela se testar perante seus dragões e os Mestres da Baía dos Escravos. De outro Jon Snow é impelido por Sansa, quem diria, a enfrentar seu destino com bravura. Uma das coisas que tenho mais curiosidade em ver é como os destinos desses dois personagens eventualmente se cruzarão em Game of Thrones. Espero, sinceramente, que não seja apenas através de uma aliança de batalha contra os Whithe Walkers.
Na próxima semana, porém, veremos outras jornadas importantes se desenvolver: Theon e sua atuação no Kingsmoot para tentar conseguir colocar sua irmã no poder; Tyrion e um misterioso encontro com uma outra Mulher Vermelha; Arya e o refinamento de suas habilidades; e Bran, que enfim cruzará o caminho do Night King e de sua verdadeiramente aterrorizante legião de mortos. Assim como o Livro do Estranho, tudo são presságios de morte e destruição gélida.
Série: Game of Thrones
Temporada: 6ª
Episódio: 04
Título: Book of the Stranger
Roteiro: David Benioff e D.B. Weiss.
Direção: Daniel Sackheim
Elenco: Peter Dinklage, Nikolaj Coster-Waldau, Lena Headey, Emilia Clarke, Kit Harington, Liam Cunningham, Sophie Turner, Alfie Allen, Gwendoline Christie, Jonathan Pryce, Carice van Houten, Tom Wlaschiha e Natalie Dormer.
Graus de KB: 2: Natalie Dormer atuou em Jogos Vorazes: A Esperança – O Final (2015) ao lado de Donald Sutherland, que esteve em JFK – A Pergunta que Não Quer Calar (1991) com Kevin Bacon.
esse episodio 4 foi super empolgante, o reencontro de Sansa com Jonh Snow e a renascida da tormenta, a mãe dos Dragões em volto em chamas e majestosa mostrando pra que veio… que não é só uma carinha bonita,inocente e delicada botando fogo no rabo dos Khals fechando o episodio com grandeza…
Excelente review
Acho que o encontro de Sansa e Jon foi talvez o momento mais “feliz” do seriado até agora. Vamos ver até quando (risos).
Quanto a parte de Khaleesi só achei meio “forçado” a forma como os personagens se encontram “magicamente”. E a cena da cabana pegando fogo tem uma pegada meio atrapalhada tipo Trapalhões (risos).
Mas o episódio foi bom e o texto tá excelente como sempre.