Crítica | Propriedade (2022)

Crítica | Propriedade (2022)

O diretor e roteirista Daniel Bandeira mostra em seu filme “Propriedade” uma alegoria bastante didática e literal sobre a luta de classes. O tom da narrativa lembra um pouco “Bacurau”, no entanto Bandeira apresenta uma trama que se aproxima mais da realidade brasileira atual.

O Ministério do Trabalho e Emprego resgatou 1.443 trabalhadores de condições análogas à escravidão em 2023, somente no 1º semestre. Ou seja, mais de 135 anos após o fim da escravidão, ela ainda resiste no Brasil. Essa informação é importante para se entender o contexto da história de “Propriedade”. Mas vamos chegar lá.

A protagonista do filme é Tereza (Malu Galli), uma mulher que passou por um trauma ao ser sequestrada por um bandido, que foi morto durante ação da polícia. Roberto (Tavinho Teixeira), seu marido, decidiu comprar um novo carro e blindá-lo, dessa forma aumentando a segurança da sua família.

A segurança pública é um problema grave no Brasil e tanto governos de esquerda quanto de direita vivem um negacionismo em relação ao tema. Assim, aqueles que têm dinheiro pensam somente em si e reforçam carros, colocam câmeras em suas residências, deixando o problema da desigualdade social de lado.

Voltando para a trama de “Propriedade”, Roberto decide levar Tereza para a fazenda da família com o intuito de que a tranquilidade do lugar, o problema é quando eles chegam lá uma revolta está em execução. A montagem é inteligente ao só mostrar os acontecimentos que levaram à conturbação após o casal chegar ao local.

O motivo da revolta é que Roberto decidiu vender a fazenda e o local será transformado em um hotel. Dessa forma, os trabalhadores do lugar perderão seu emprego e terão que arrumar outro lugar para morar. Afinal de contas, eles moram em pequenas propriedades dentro do terreno e consideram a sua casa, só que na prática não são.

Alguns desses funcionários são mais antigos, daqueles que dedicaram a sua vida toda ao trabalho na fazenda, então sair dali não parece ser uma opção muito viável. Talvez os mais novos ainda tenham alguma chance de encontrar uma nova alocação. O problema é que o documento de todos eles está preso dentro de um cofre dentro da residência do dono do lugar, que diz que só irá entregar após a dívida de cada um ser paga. Esse débito é referente a despesas pessoais, como roupas e celulares. Diante do impasse o conflito se inicia e o desenrolar dele reserva muitas surpresas.

A tensão principal gira em torno do carro blindado, pois Tereza consegue fugir da residência e se refugia dentro do carro. O problema é que o veículo é moderno e necessita de uma chave de ativação de voz, que ela não lembra, pois foi o marido que configurou. Assim os trabalhadores procuram formas de abrir o automóvel ou então fazer com que a mulher saia de lá. Enquanto isso aumenta o nervosismo da classe trabalhadora, já que surgem outros conflitos dentro da fazenda.

Daniel Bandeira cria um clima de tensão e suspense muito bom. Além disso, explora o desenvolvimento dos personagens, onde o lado humano de cada um é fundamental. Seja dos trabalhadores que exigem seus direitos, quanto do casal dono da fazenda que preza pela sua segurança. Isto é, “Propriedade” analisa a questão da luta de classes com um exemplo prático e contemporâneo. O resultado é um filme extremamente atual, que explora a temática de forma inteligente e visceral. Sem dúvidas um dos melhores e mais impactantes longa-metragem de 2023.


Uma frase: – Roberto: “Quem é que vai começar a explicar o que está acontecendo aqui?”

Uma cena: Quando Tereza consegue ligar o carro e tenta fugir da fazenda.

Uma curiosidade: As gravações do filme foram realizadas em 2018 com locações na Fazenda Morim, de São José da Coroa Grande, município de Pernambuco.


Propriedade

Direção: Daniel Bandeira
Roteiro: Daniel Bandeira
Elenco: Malu Galli, Zuleika Ferreira, Tavinho Teixeira, Samuel Santos e Ane Oliva
Gênero: Drama, Suspense
Ano: 2022
Duração: 100 minutos

Ramon Prates

Analista de sistemas nascido em Salvador (BA) em 1980, mas atualmente morando em Brasília (DF). Cinema é sem dúvidas o meu hobby favorito. Assisto a filmes desde pequeno influenciado principalmente por meus pais e meu avô materno. Em seguida vem a música, principalmente rock e pop.

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