Crítica | Crimes of the Future (2022)
Isso é arte? Esse é um questionamento que muitas vezes temos quando nos deparamos com alguma obra de arte. A filmografia de David Cronenberg sempre nos faz refletir sobre isso, pois seus filmes costumam nos impactar com seus temas. Seus últimos longas-metragens seguiram por um caminho mais “tradicional”, mas agora em “Crimes of the Future” o cineasta volta a sua essência.
Estamos em um futuro distópico onde as pessoas parecem “anestesiadas” a ponto de necessitar de uma nova forma de encontrar prazer e de se expressar. Assim conhecemos Saul Tenser (Viggo Mortensen), que junto com sua parceira Caprice (Léa Seydoux) realiza cirurgias nele como uma performance artística. Esses procedimentos também funcionam como uma forma de prazer, uma nova maneira de fazer sexo
Saul também tem uma particularidade: ele tem a capacidade de gerar novos órgãos dentro do seu corpo, que parecem tumores dentro dele, mas na verdade são apenas órgãos aparentemente sem função. Assim, suas performances envolvem cirurgias que removem esses órgãos de dentro dele. Mas será que isso poderia ser classificado como arte? Os efeitos visuais são muito bons ao misturar elementos práticos com CGI, deixando as cenas mais verossímeis e impactantes.
Esse é o tema principal de Crimes of the Future, onde David Cronenberg explora bem esses procedimentos e os sentimentos que eles impactam no espectador. As cirurgias são ao mesmo tempo belas e nojentas. E vemos também como isso influencia nas relações entre os personagens, especialmente entre Saul e Caprice, que aparentemente seriam apenas parceiros artísticos, mas parecem ir além em algo mais “romântico”.
Cronenberg extrapola o assunto principal, explorando outros temas dentro desse universo, criando um mundo curioso e fascinante. É interessante notar como os cenários representam uma “decadência” da sociedade, onde vemos ruas que parecem abandonadas e dentro dos lugares as paredes estão sempre com a tinta descascada.
É curioso observar também a política dentro da narrativa representada através de um setor governamental responsável por catalogar esses novos órgãos criados por artistas como Saul Tenser. A personagem Timlin de Kristen Stewart tem o papel de investigar e definir as categorias, como se o governo tivesse o papel de determinar se aquilo é “arte” ou não.
Outro tópico é sobre o fato de os humanos desenvolverem habilidade de comer plástico, que de certa forma ajuda a solucionar um dos maiores problemas da Terra que é o descarte de material plástico. Isso também serviria para acabar com a fome no mundo. Infelizmente esse é um dos temas que não tem um desenvolvimento maior dentro de Crimes of the Future.
Assim, talvez o único “pecado” de Crimes of the Future é por deixar muita coisa em aberto. Por um lado, é interessante o impacto que a narrativa causa ao criar reflexão, afinal de contas esse é o papel fundamental da arte. De outro, é um pouco decepcionante ver tantos temas fascinantes não terem um aprofundamento maior, como por exemplo o concurso de “beleza interior”.
Uma frase: – Timlin: “A cirurgia é o novo sexo.”
Uma cena: A primeira performance de Saul Tenser.
Uma curiosidade: Viggo Mortensen sofreu um trauma quádruplo quando atingido por um cavalo não participante no American Kentucky Derby e, como resultado, não conseguiu ficar em pé por períodos superiores a dois minutos. Isso resultou em seu personagem ficar constantemente ajoelhado enquanto fazia exposições e monólogos.
Crimes of the Future
Direção: David Cronenberg
Roteiro: David Cronenberg
Elenco: Viggo Mortensen, Léa Seydoux, Kristen Stewart, Don McKellar
Gênero: Drama, Terror, Ficção científica
Ano: 2022
Duração: 107 minutos