Crítica | Thor: Amor e Trovão
Em “Thor: Ragnarok” o diretor Taika Waititi apresentou um novo estilo dentro do MCU onde o principal tom dentro da história era o cômico. Isso causou um certo estranhamento se compararmos com os filmes anteriores do personagem onde não parecia ser o mesmo Thor visto anteriormente. Agora em “Thor: Amor e Trovão” o cineasta encontrou o equilíbrio perfeito entre a “zoeira” e a aventura épica, que era o gênero principal do herói.
A bem da verdade é que a comédia sempre esteve presente nos longas-metragens da Marvel, mas normalmente eram com alívios cômicos. O que Waititi faz é colocar a comédia como centro da narrativa, mas agora ela se equilibra melhor com os outros gêneros existentes no filme. Para deixar claro que o humor não iria passar por cima do resto, a cena inicial de “Thor: Amor e Trovão” foca no drama e na emoção ao apresentar o vilão Gorr, interpretado por Christian Bale. O homem está no meio do deserto junto com sua filha, tudo em tons de cinza, que nada lembram a explosão de cores vista em Ragnarok. Após a morte da criança ele busca ajuda de um deus, mas é ridicularizado por ele. Surge então uma espada que é capaz de matar deuses e assim ele se transforma no Carniceiro dos Deuses, jurando matar todos eles por vingança.
Voltamos então para Thor e, da última vez que o vimos, ele estava junto com os Guardiões da Galáxia. Nas últimas obras do MCU, temos visto um herói se juntar ao filme do outro no intuito de aproveitar os diversos já existentes no universo. Felizmente em “Thor: Amor e Trovão” os Guardiões aparecem apenas de passagem, já que a jornada do protagonista não os envolve. Contudo, mesmo com menos tempo na tela, é possível afirmar que a protagonista do longa-metragem é Jane Foster. Ela que erroneamente não aparece em Ragnarok e agora retorna para encerrar seu arco narrativo, além de concluir sua história junto com Thor. O roteiro corrige o “buraco” existente e dessa vez explica direitinho o que houve entre o casal e gerou o final do relacionamento, em um dos melhores momentos do filme.
A questão é que agora Jane está com câncer e ao realizar uma visita a Nova Asgard o martelo destruído de Thor se reconstrói e ela se transforma na Poderosa Thor. Essa pode ser uma solução temporária para a sua questão de saúde, mas talvez não seja tão simples. Retornando ao local, ela também conhece Valkyrie (Tessa Thompson), que é a rei da cidade, e não demora para reencontrar com seu ex-namorado. Os três se reúnem para derrotar Gorr, que sequestrou crianças do lugar. Resta então ao trio procurar ajuda e eis que decidem ir em busca dos outros deuses e assim começa a jornada do filme.
Outro problema que tínhamos em Ragnarok era que o tom cômico não ficava claro entre todos os personagens, então o tempo todo parecia que Thor estava zoando com quem estava ao redor, que estava levando tudo a sério. Isso também é corrigido em Amor e Trovão e a direção de elenco é fundamental para isso funcionar. Isso fica claro na atuação de Chris Hemsworth, que dessa vez encontra o meio-termo entre a seriedade e o humor. Assim se em um momento mais descontraído ele faz alguma piada, como por exemplo quando o seu atual martelo mostra ciúmes sobre seu “ex martelo”, agora sob o comando de Jane, no outro quando está sob alguma ameaça do vilão ele leva aquilo a sério, apresentando sobriedade sobre a situação.
A performance de Christian Bale, por exemplo, é magnífica e talvez ele seja um dos vilões mais interessantes do MCU até agora. Ele apresenta a dualidade perfeita entre uma causa que parece justa, apesar de errada, ao querer vingança dos deuses pela morte da filha. O ator mostra seu lado sombrio e até mesmo levemente cômico e irônico na construção de Gorr, além da parte física necessária para as lutas contra os heróis. Inclusive vale ressaltar outro ponto positivo de Amor e Trovão que é o fato de não termos uma batalha final contra uma grandiosa criatura de CGI.
Em relação a parte técnica, é interessante notar como todos os elementos contribuem para definir o equilíbrio necessário sobre o tom da narrativa. Um bom exemplo é a trilha sonora de Michael Giacchino, com a colaboração de Nami Melumad, que em determinados momentos apresenta temas épicos grandiosos, para em seguida mostrar músicas com pegada mais rock, ou então sintetizadores estilo anos 1980. Essa mistura é construída de maneira coesa, sempre casando perfeitamente com a trama. É importante também citar o uso das músicas do Guns N’ Roses que contribuem de maneira brilhante em criar o estilo de Amor e Trovão, com uma mistura de nostalgia e frescor.
Do mesmo modo a fotografia é um elemento importante e junto com o design de produção apresenta um universo que é um espetáculo visual, indo da explosão de cores, especialmente dourada, vista no mundo dos deuses, ao uso de tons de cinza nos encontros dos heróis com o vilão Gorr. Inclusive temos uma cena em preto e branco que surpreende, mostrando que Taika Waititi — assim como Sam Raimi fez em “Doutor Estranho no Multiverso da Loucura” – é capaz de colocar elementos autorais dentro do MCU.
Em síntese, “Thor: Amor e Trovão” mostra que Taika Waititi encontrou o tom correto para equilibrar aventura e comédia, sem que o protagonista deixasse de ser ele mesmo. A jornada do herói é bem interessante e surpreendentemente emotiva, mesmo com piadas sobre isso.
Uma frase: – Gorr: “Os únicos com quem os deuses se importam são eles mesmos. Então, este é o meu voto: todos os deuses morrerão.”
Uma cena: A cena de abertura do filme que mostra a origem do personagem Gorr.
Uma curiosidade: O filho de Chris Hemsworth, Tristan, interpreta o jovem Thor no filme, embora não seja creditado.
Thor: Amor e Trovão (Thor: Love and Thunder)
Direção: Taika Waititi
Roteiro: Taika Waititi e Jennifer Kaytin Robinson
Elenco: Chris Hemsworth, Christian Bale, Tessa Thompson, Jaimie Alexander, Taika Waititi, Russell Crowe e Natalie Portman
Gênero: Ação, Aventura, Comédia
Ano: 2022
Duração: 119 minutos
Discordo que Jane Foster seja protagonista com mesmo tempo de tela que Thor. Nem acho que, na verdade, esse seja o maior problema na construção da personagem no filme. Fiquei muito incomodada de ser apresentada a uma nova heroína no MCU que somente serviu de recurso narrativo para a jornada do herói masculino. E a justificativa que vi muitas pessoas darem para isso é a de que essa é a história dela nos quadrinhos. Desde quando a Marvel segue literalmente o que é estabelecido nas HQs? A adaptação para o universo cinematográfico e para as séries sempre foi muito flexível. Inconcebível é ter apenas uma amostra grátis da Poderosa Thor, que para além das cenas de demonstração de força física e frases de efeito de empoderamento feminino, em pleno 2022, se mantém tão clichê quanto qualquer filme dos anos 1980. O triste e precoce fim dado à personagem lembra o erro cometido com Viúva Negra. Só foi existiu para ser a coadjuvante da história dos homens. Lamentável.
Considerando que a personagem dela era só uma “mocinha”, foi bom ter visto esse seu lado de heroína. Mas concordo com você que ainda é pouco e que talvez ela pudesse ter um destino final mais interessante. Com certeza a Marvel ainda tem um longo caminho no cinema em relação às personagens femininas.