Crítica | A Felicidade das Pequenas Coisas

Crítica | A Felicidade das Pequenas Coisas

Você já deve ter ouvido falar que o Butão é o país mais feliz do mundo, não é? Isso acontece porque o governo de lá busca medir a felicidade do povo através de um tipo de questionário e toma decisões baseadas nele.

O jovem professor Ugyen parece não experimentar dessa felicidade. Ele tem mais um ano para cumprir em seu emprego público, mas a vontade dele é mudar-se para a Austrália e seguir uma carreira de músico. Só que ele recebe a missão de dar aulas em Lunana, um vilarejo incrustado na montanha.

Ugyen mora na capital do país e aproveita seus confortos e modernidades. A ideia de lecionar na escola mais remota do mundo o perturba, mas ele precisa terminar esse período de trabalho obrigatório para o governo.

Temos aqui a história de um professor que sai de sua zona de conforto para tentar contribuir na educação de crianças que estão isoladas do mundo. O caminho para Lunana já é uma tortura para Ugyen, com 8 dias de caminhada subindo o morro e tendo contato com uma realidade que o incomoda. Durante esse percurso ele se mostra sempre indiferente às pessoas ao seu redor e muitas vezes até de uma maneira desrespeitosa.

Chegando lá ele se depara com uma escola sem recursos. O quadro negro não existe, o material didático é escasso e a estrutura é precária. Apesar disso, a escola possui a coisa mais importante de todas: crianças com uma enorme vontade de aprender.

A figura do professor é extremamente valorizada em A Felicidade das Pequenas Coisas. Ugyen é alvo de reverência por parte de todos, pois como um montanhês diz, o professor é capaz de tocar o nosso futuro. É realmente comovente ver o respeito e a esperança que eles depositam em Ugyen. Eis uma das profissões mais importantes e honradas que existem, afinal o professor pode ser decisivo na evolução de uma criança em vários aspectos. E isso fica ainda mais evidente em um lugar como Lunana. Aos poucos, ele sente que precisa fazer o melhor que pode para ajudar essa comunidade.

Além de abordar de forma sensível a importância fundamental da educação, A Felicidade das Pequenas Coisas nos convida a mergulhar em uma cultura completamente diferente da nossa por duas horas. Entendemos que ali o consumismo desenfreado não existe e os montanheses se contentam com o básico e a maioria é feliz.

Em uma aula de inglês, uma criança não sabe o que é “car”, mas sabe é o que “cow”. Nada mais justo, afinal é da vaca que vem o leite que ela toma todo dia. Essa cena diz muito sobre o que merece o apreço deles. E também podemos falar do iaque – um parente do búfalo – que com suas fezes ajuda o povo na obtenção de calor ou de uma música antiga entoada com muito sentimento.

Ugyen vai até Lunana para ensinar e no final das contas é ele quem acaba aprendendo. Aprende sobre uma cultura diferente, aprende sobre o que é o essencial para o ser humano e aprende um pouco mais sobre ele mesmo.

A Felicidade das Pequenas Coisas chama a atenção para o Butão e mostra que ele tem muito a oferecer. Não fosse a indicação ao Oscar de Melhor Filme Internacional talvez ele passaria batido. Como é importante buscar a diversidade em uma premiação como essa, não é mesmo?

Devemos ressaltar a força de vontade da equipe de produção para nos contar essa história! Esse é o primeiro trabalho de Pawo Choyning Dorji, um diretor que nunca estudou cinema e nos entregou um grande filme. Com uma direção segura, sem floreios e que nos momentos certos explora a beleza do Himalaia e de toda a região. Ele basicamente deixa o elenco atuar. Inclusive, a maior parte dos personagens é formada por não atores, deixando tudo ainda mais autêntico.

Essa é uma experiência que toca no nosso lado mais humano e que nos faz refletir sobre nossas escolhas e atitudes. Trata-se de um filme agradável que nos apresenta a algo que não estamos acostumados a ver e nos encanta no processo.

Claro, não é um filme perfeito. Os excessos na composição de Ugyen no início e a maneira abrupta como ele se transforma podem ser consideradas como falhas. De qualquer forma, conseguimos relevar e entender os objetivos. Aqui é preciso olhar o contexto geral.

Provavelmente, A Felicidade das Pequenas Coisas não irá levar o Oscar, mas estar na lista dos 5 melhores é um feito enorme. Cabe a nós como cinéfilos valorizar o filme e tudo o que ele representa.


Uma frase: “- A subida vai ser difícil?
– Vai ser fácil. É um passeio ao lado do rio por seis dias. Depois tem uma subidinha. Quando chegarmos lá em cima, a caminhada é ótima. Você vai querer que nunca acabe.”

Uma cena: A “capitã” da classe indo acordar o professor que não apareceu na aula.

Uma curiosidade: Todos os atores em Lunana são montanheses, a maioria nunca viu o mundo externo. Nunca viram um filme e nunca tinham visto câmeras antes. E foi a primeira vez que usaram pasta de dente.


A Felicidade das Pequenas Coisas (Lunana: A Yak in the Classroom)

Direção: Pawo Choyning Dorji
Roteiro: Pawo Choyning Dorji
Elenco: Sherab Dorj, Ugyen Norbu Lhendup, Kelden Lhamo Gurung, Pem Zam, Sangay Lham
Gênero: Drama, Família
Ano: 2019
Duração: 110 minutos
IMDb

Bruno Brauns

Fã de sci-fi que gosta de expor suas opiniões por aí! Oinc!

2 comentários sobre “Crítica | A Felicidade das Pequenas Coisas

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