Crítica | T2 Trainspotting

Crítica | T2 Trainspotting

Era necessário fazer uma continuação de Trainspotting? Provavelmente não. Mas por que não fazer? O autor do livro, Irvine Welsh, já tinha escrito uma sequência (chamada Pornô), então agora que os atores estão com a idade dos personagens era uma boa idéia. Só que talvez o timing não tenha sido dos melhores, já que vivemos uma época de nostalgia no cinema com diversas continuações, remakes e derivados.

Três palavras definem bem T2 Trainspotting: nostalgia, vingança e melancolia.

Nostalgia com certeza é a principal. O primeiro filme foi bastante marcante e causou uma grande repercussão na cultura pop. Então reencontrar com os personagens tão queridos mais de 20 anos depois causa sentimentos de felicidade e familiaridade, algo como encontrar aqueles amigos que não vemos há anos. Essa é a melhor forma de descrever o reencontro com Mark “Rent Boy” Renton (Ewan McGregor), Daniel “Spud” Murphy (Ewen Bremner), Simon “Sick Boy” Williamson (Jonny Lee Miller) e Francis “Franco” Begbie (Robert Carlyle). O elenco é o elemento mais importante para que essa viagem nostálgica funcione. É impressionante ver como os atores retornam facilmente a seus respectivos papéis.

Renton fugiu com o dinheiro dos amigos conseguido com uma venda de drogas no final do primeiro Trainspotting. Logo na primeira cena da continuação encontramos o personagem vinte anos depois correndo em uma esteira. Ou seja, ele está cuidando da saúde, algo que com certeza sua versão mais jovem não se preocupava. Após um pequeno susto causado por um problema de saúde, ele volta a sua cidade natal. Primeiro ele reencontra com Spud, que continua quase o mesmo, e o pior, ainda sofrendo com o vício em drogas. Já Sick Boy ganha a vida fazendo vídeos de homens fazendo sexo não tradicional com sua namorada Veronika (Anjela Nedyalkova) para depois chantageá-los em troca de dinheiro. Por último Franco consegue fugir da prisão e vai em busca de Renton atrás de vingança (a segunda palavra que define o filme). Renton quer de alguma forma ajudar os dois primeiros amigos, então ele se junta a Sick Boy para arrumar dinheiro para que o cara possa abrir um bordel para a namorada. Ou seja, eles vão se meter em diversas confusões que lembram bastante a época em que eram jovens.

Ao encontrar com os personagens novamente e perceber que eles não mudaram muito é algo triste. E o diretor Danny Boyle explora bem esse sentimento. Isso é bem representado na trilha sonora, que utiliza algumas das músicas que marcaram a trilha sonora do primeiro filme – com canções de Iggy Pop, Lou Reed e Underworld, para citar alguns – com arranjos mais lentos tornando-as mais tristes. Esse recurso mistura bem a nostalgia junto com a melancolia, como se lembrar do passado trouxesse más recordações.

O filme explora bem essa relação do passado com o presente. Por isso é interessante ter Veronika como uma nova personagem mais jovem para fazer um contraste com os antigos. Em determinada cena Renton e Sick Boy estão lembrando de coisas da sua época de jovens, como partidas de futebol ou um show, de forma nostálgica e feliz. Só que a garota enxerga a vida diferente, vendo o passado como algo a não ser repetido, e não como algo a ser lembrado com alegria. Não faltam também simbolismos, como por exemplo, Renton chegar em casa e escolher um disco de vinil para ouvir em sua antiga radiola. Só que os antigos LPs estão na moda novamente, então fica a mensagem que as vezes coisas antigas podem fazer sentido nos dias atuais.

O passado também é explorado através de flashbacks. Boyle utiliza bem o recurso de duas formas diferentes. Uma tradicional, mostrando imagens do primeiro filme, e outra mais interessante, ao projetar as imagens em uma parede ou na superfície de um carro, dando a impressão que os personagens estão diante de um vídeo antigo de suas vidas.

O primeiro filme tinha uma linguagem nova e original em sua parte técnica, com um ritmo frenético e uma fotografia inovadora. O diretor segue um ritmo mais lento, afinal de contas os protagonistas estão mais velhos, mas ele utiliza recursos parecidos. Um exemplo é a utilização de freeze frames, que é uma pausa na imagem como se uma fotografia tivesse sido tirada. Nessa continuação ele não consegue realizar o mesmo frescor de novidade do filme anterior, mas esse não era o objetivo. A idéia era seguir um estilo parecido, mas que também não parecesse uma mera imitação ou repetição.

Obviamente que T2 Trainspotting não tem o mesmo impacto do primeiro filme, e muito menos cenas e músicas tão icônicas quanto. Mas ainda sim é interessante reencontrar com esses personagens mais de 20 anos depois e perceber que talvez eles não tenham mudado tanto. Já o mundo, esse mudou bastante, mas o “choose life” – com uma atualização com referências aos dias atuais, é claro – continua tão atual quanto.


Uma frase: – Spud: “Primeiro, tem uma oportunidade. Depois… tem uma traição.”

Uma cena: Renton explicando para Veronika o significado da frase “choose life”..

Uma curiosidade: A última vez que Ewan McGregor e Danny Boyle trabalharam juntos foi em Por uma Vida Menos Ordinária (1997). A dupla se desentendeu durante a seleção do elenco de A Praia (2000), quando McGregor – que pretendia protagonizar a trama – foi substituído por Leonardo DiCaprio.


T2 Trainspotting

Direção: Danny Boyle
Roteiro: John Hodge
Elenco: Ewan McGregor, Ewen Bremner, Jonny Lee Miller, Anjela Nedyalkova, Shirley Henderson, James Cosmo, Kelly Macdonald e Robert Carlyle
Gênero: Drama
Ano: 2017
Duração: 117 minutos

Ramon Prates

Analista de sistemas nascido em Salvador (BA) em 1980, mas atualmente morando em Brasília (DF). Cinema é sem dúvidas o meu hobby favorito. Assisto a filmes desde pequeno influenciado principalmente por meus pais e meu avô materno. Em seguida vem a música, principalmente rock e pop.

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