Crítica | Chatô – O Rei do Brasil

Crítica | Chatô – O Rei do Brasil

É impossível falar sobre o filme “Chatô – O Rei do Brasil” sem citar os problemas que a produção enfrentou com o financiamento público e desvio de dinheiro. Vinte anos após o início do projeto, o diretor Guilherme Fontes conseguiu concluir e lançar seu trabalho. Felizmente o resultado final na tela é muito bom e não demostra sinais de problemas. Uma das coisas que chama a atenção é o fato dele conseguir não soar datado. E ainda acabou sendo lançado em uma época em que faz ainda mais sentido, soando mais atual do que nunca. Sem dúvidas é um trabalho bastante ambicioso feito por uma pessoa inexperiente, mas que conseguiu se sair muito bem.

O roteiro do filme é baseado no livro de Fernando Moraes, mas o tom escolhido por Fontes, que escreveu o roteiro junto com Matthew Robbins (“A Colina Escarlate”) e João Emanuel Carneiro (da novela “Avenida Brasil”), é mais exagerado e alegórico, combinando muito bem com o estilo excêntrico do personagem principal. Apesar desse tom um pouco mais bem humorado o filme não deixa de lado a parte séria da história e tenta não esconder os principais problemas do protagonista.

Assis Chateaubriand (Marco Ricca) era uma espécie de “Cidadão Kane” brasileiro e a intenção do filme de Fontes era fazer a versão brasileira do filme de Orson Welles, mas obviamente que ele não tem o mesmo talento do cineasta americano. Chatô foi um magnata das comunicações dono de um conglomerado de jornais, rádios e televisão. A ideia do filme é mostrar o personagem sendo julgado num programa de televisão chamado “O Julgamento do Século”. Nele iremos acompanhar alguns dos fatos de sua vida e depoimentos de pessoas que fizeram parte dela para julgar o seu comportamento.

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Essa é a principal linha narrativa que mistura devaneios do personagem ao descobrir uma doença (trombose), que o fez ficar um bom tempo hospitalizado, com idas e vindas na sua vida onde iremos acompanhar os fatos mais marcantes de sua trajetória. Tudo feito de maneira alegórica e até mesmo um pouco carnavalesca. A montagem do filme ficou muito boa em conseguir achar um ritmo e um equilíbrio nessas idas e vindas criando um estilo visual bem interessante e moderno, lembrando um pouco a agilidade de filmes como “Cidade de Deus”.

A fotografia, figurino e cenografia também retratam bem a época e presta boas homenagens. Um exemplo é durante uma viagem de avião mostrar o mapa com a aeronave se movimentando representada por uma linha vermelha, como nos filmes dos anos 40 que também é homenageada nos filmes de Indiana Jones. Temos alguns efeitos visuais para retratar alguns lugares históricos que funcionam de maneira satisfatória, apesar de serem um pouco simples. O uso das cores é muito bem realizado como numa cena em que Chatô está delirando dentro de um carro e o mesmo para no sinal vermelho, então vemos a cor em destaque no rosto do personagem sinalizando que algo grave vai acontecer. Ou o uso da iluminação numa cena do 1º encontro entre Chatô e Getúlio que deixa o 1º mais claro e o 2º mais escuro ilustrando o jogo de poder entre os dois.

Agora sem dúvidas o que chama mais a atenção é que o tema é mais atual do que nunca. O roteiro envolve muitos fatos importantes da história do Brasil que são muito bem referenciados. Chatô era advogado, mas queria trabalhar num jornal porque ele tinha opinião. Mas como ele mesmo aprende e depois passa para um subordinado: para poder dar a sua opinião é preciso que você seja o dono do jornal. E ele levou esse poder dos meios de comunicação a sério para fazer chantagem, seja com políticos, no caso Getúlio Vargas, ou com seus anunciantes. Se o presidente fez algo que ele não aprova, no caso Getúlio estava tendo um caso com uma mulher que ele gostava, então coloca no jornal a manchete o chamando de corrupto. Se uma marca de refrigerante quer pagar menos por anúncios, então coloca a manchete que foi encontrado um rato dentro de uma bebida. Assim a marca vai vender menos e vai ser obrigada e gastar mais com anúncios em seus meios de comunicação. Ainda bem que em 2015 esse tipo de coisa não acontece mais e os meios de comunicação não divulgam “notícias” de acordo com os seus próprios interesses (risos). E além disso, não existem mais grandes conglomerados de meios de comunicação nas mãos de poucas pessoas (risos ainda maiores).

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O elenco também merece muitos elogios. Marco Ricca entrega uma atuação muito boa como Chatô cheia de carisma ao mostrar o personagem como uma figura excêntrica e até um pouco caricata com seus palavrões, sem soar totalmente exagerada. Agora quem rouba a cena sempre que aparece é Andréa Beltrão, umas das atrizes mais bonitas do Brasil, que mostra muita química com o restante do elenco e tem a melhor performance do filme apesar do seu personagem ser ficcional. Outro destaque é Leandra Leal ainda bem novinha, mas já mostrando que iria se tornar uma atriz bastante talentosa. O próprio Guilherme Fontes também faz uma ponta muito boa fazendo referência a uma figura história da televisão brasileira.

“Chatô – O Rei do Brasil” mostra o talento de Guilherme Fontes na direção e que apesar dos problemas e da inexperiência atrás das câmeras conseguiu realizar um trabalho bastante ambicioso que consegue soar bastante atual tanto no tema que aborda como na maneira em que foi realizado.

Classificação:

Observações:

  • No final do filme um texto fala sobre os problemas e cita censura ao filme, para saber mais sobre isso leiam uma entrevista com Guilherme Fonte na Folha de São Paulo.
  • A produtora American Zoetrope deu apoio ao filme em nome de Francis Ford Coppola, a pedido de Fontes, que inclusive sugeriu a presença do roteirista Matthew Robbins para contribuir com o filme.

chato-cartazTítulo Original: Chatô – O Rei do Brasil (Brasil, 2015)
Com: Marco Ricca, Andréa Beltrão, Paulo Betti, Leandra Leal, Gabriel Braga Nunes, Eliane Giardini, Letícia Sabatella, Zezé Polessa, Guilherme Fontes, Walmor Chagas e José Lewgoy
Direção: Guilherme Fontes
Roteiro: João Emanuel Carneiro, Matthew Robbins e Guilherme Fontes baseado no livro de Fernando Moraes
Duração: 102 minutos

Ramon Prates

Analista de sistemas nascido em Salvador (BA) em 1980, mas atualmente morando em Brasília (DF). Cinema é sem dúvidas o meu hobby favorito. Assisto a filmes desde pequeno influenciado principalmente por meus pais e meu avô materno. Em seguida vem a música, principalmente rock e pop.

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