Crítica | Deserto Particular

Crítica | Deserto Particular

A busca pelo amor, pela química perfeita, pela paixão avassaladora é uma experiência profundamente subjetiva e bastante idealizada. O cineasta Aly Muritiba – nome de uma leva contemporânea muito promissora que cresceu inspirada no sucesso de Central do Brasil – escolheu, em Deserto Particular, confrontar personagens solitários, suas particularidades e expectativas, com atuações excepcionais. Filosoficamente, a pergunta que o longa nos faz é: será possível transbordar afeto e encontrar um oásis de emoções ao transpor nosso próprio deserto de ilusões?

É com essa premissa de provocar o debate sobre o amor romântico nos tempos atuais que o diretor narra a história de um encontro entre Daniel e Sara, dois apaixonados que se conheceram no mundo virtual. Milhares de quilômetros separam esse casal. Ele em Curitiba e ela, no interior da Bahia. Após ser afastado de suas funções como policial por cometer um grave erro, Daniel está infeliz, se sentindo fracassado. A rotina de sua vida se resume aos cuidados com o pai enfermo. O amor por Sara é o que ainda o mantém emocionalmente vivo. E decidido a viver esse sentimento, ele parte para encontrá-la.

Durante o primeiro e parte do segundo ato de Deserto Particular, acompanhamos essa jornada do policial. São cenas propositalmente tediosas para aproximar o espectador da ansiedade sentida por Daniel na busca por Sara, que havia parado de se comunicar com ele sem dar explicações. O filme ganha brilho, emoção e vivacidade quando Sara se revela para Daniel. O mistério que envolve esse esperado encontro e todas os seus possíveis desdobramentos eleva a narrativa e faz com que, de fato, o espectador comece a se identificar e a se importar com o futuro desse relacionamento.

Com sucesso, o candidato brasileiro a disputar uma vaga no Oscar 2022 usa a sensualidade na fotografia, por vezes intensa e, em outros momentos, delicada, transitando entre cores quentes e frias. E essa escolha se alinha coerentemente com a proposta de retratar personagens num dilema entre liberdade e moralismo, propondo a transformação do ódio em amor. Nas palavras do diretor, o drama é um “mergulho num Brasil profundo”. E que consegue ir além ao tangenciar um debate sobre masculinidades e identidade de gênero.


Uma frase: “Quem é você, Daniel?”

Uma cena: Daniel e Robson conversando em frente a represa do Rio São Francisco.

Uma curiosidade: O diretor homenageia Sérgio Machado, com uma cena de Cidade Baixa e também reverencia no filme os longas O Céu de Suely, de Karim Aïnouz, e Central do Brasil, de Walter Salles.


Deserto Particular

Direção: Aly Muritiba
Roteiro: Aly Muritiba e Henrique dos Santos
Elenco: Antonio Saboia, Pedro Fasanaro, Thomas Aquino, Zezita Matos, Luthero Almeida, Laila Garin, Sandro Guerra, Otavio Linhares e Cynthia Senek
Gênero: Drama
Ano: 2021
Duração: 120 minutos

Bianca Nascimento

Filha dos anos 80, a Não Traumatizada, Mãe de Plantas, Rainha de Memes, Rainha dos Gifs e dos Primeiros Funks Melody, Quebradora de Correntes da Internet, Senhora dos Sete Chopes, Khaleesi das Leituras Incompletas, a Primeira de Seu Nome.

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