Crítica | Sonic: O Filme

Crítica | Sonic: O Filme

Se há alguns meses atrás você esbarrasse em mim na rua, batesse no meu ombro e me perguntasse “e o filme do Sonic, hein? Vai ser massa?” eu te devolveria um olhar de incredulidade acompanhado um sonoro “err… NÃO…?” e uma gargalhada sarcástica. Mas tal qual o título da música de Phil Collins, o longa do ouriço supersônico foi contra todas as probabilidades e… deu certo. Mais certo do que tinha o direito de dar, inclusive.

Se você chegou no planeta Terra agora, ou é um hipster que só jogou Odyssey e parou de dar bola para videogames quando estes se tornaram cool, eu te explico quem é Sonic: desenvolvido para ser a mascote e a cara da empresa (do ramo de videogames) Sega e bater de frente com a Nintendo e seu popular herói Mario (que Mario? Aquele mesmo, o que salvou a princesa Peach), o ouriço (sim, ele é um OURIÇO, ao contrário do que diz a crendice popular que o acusa de ser um porco-espinho) azul e supersônico e se tornou um sucesso de vendas, colocando a companhia japonesa em posição privilegiada no mercado e atirando a mascote anterior (um moleque irritante chamado Alex Kidd) no esquecimento.

O carismático bichinho rendeu uma série muito lucrativa de jogos e vários derivados, como desenhos-animados, quadrinhos e paródias pornô, mas não salvou a Sega de ser obliterada pela Sony e ter que se retirar do mercado de hardware para games durante sua sexta geração, restringindo-se à atividade publicadora e distribuidora de jogos.

No entanto, o veloz porco-esp… ouriço permaneceu no imaginário popular dos gamers e mesmo daqueles que não são tão ligados assim em joguinhos eletrônico, sendo inclusive, eleito um dos personagens do entretenimento digital mais influentes de todos os tempos pela revista TIME.

Não seria, portanto, uma grande surpresa que eventualmente o “relâmpago azul”, como é conhecido (mentira, acabei de inventar) se renderia ao celuloide (desculpa, referência de gente velha, é tudo digital agora) e seria trazido para a telona.

Porém, toda a receita do desastre estava pronta: como costuma acontecer com frequência com esse tipo de franquia, os direitos do filme quicaram de estúdio em estúdio, por anos, até parar no colo da Paramount. Que, para a surpresa de zero pessoas, optou por gastar pouco e contratar uma dupla de roteiristas inexpressivos (cujo currículo é composto basicamente de filmes para TV) e um diretor desconhecido. Para o elenco, alguns nomes medianos e um grande ator de peso (porém em franca decadência) para chamar a atenção do público. Além disso, era uma adaptação de um jogo de videogame, e todos sabemos que isso não costuma acabar bem.

Não bastasse isso, o primeiro teaser, apresentado no final de Abril mostrava um Sonic diferente, com proporções humanas, uma boca cheia de dentes e os olhos de um serial killer. Claro que o fandom caiu matando e muito buzz negativo foi gerado em torno do filme (mais buzz do que já tinha). Resultado: não bastasse os elementos citados no parágrafo anterior, os efeitos especiais tiveram que basicamente ser refeitos do zero, para restaurar o visual original e a dignidade do protagonista e tentar salvar a película da absoluta obliteração.

E olha… deu certo.

O filme é uma fusão de fórmulas batidas, mas que costumam funcionar para esse tipo de cinema pipocão: primeiro, temos uma pitada de jornada do herói; depois, pega-se o bonde de adaptações cinematográficas de personagens fantásticos para o mundo real (à exemplo que foi filme no filme dos Smurfs e em Detetive Pikachu); adicione a isso tudo uma boa dose dose de filme de origem de super-herói e tcham-ram, e temos ai a receita do sucesso (ou ao menos a receita de uma boa diversão despretensiosa).

Não que importe muito, mas dando uma pincelada na trama: perseguido por ter nascido com habilidade sobrenaturais (a sua supervelocidade), o porc… ouriço mais famoso dos games estava vivendo uma vida desgraçada e caótica, pulando de universo paralelo para universo paralelo (graças ao poder de uns anéis mágicos, presente de sua mentora) até encontrar uma relativa paz em nosso mundo. Claro que essa paz não é duradora, vivendo como uma eremita e sem amigos, Sonic eventualmente dá uma surtada, liberando seus poderosos “relampeosos” e causando uma espécie de EMP que deixa boa parte dos EUA sem luz.

Intrigados com o fenômeno, os militares recorrem aos serviços do brilhante e excêntrico cientista Dr. Robotnik (Jim Carrey) para entender e resolver seja lá que diabos aconteceu naquela cidadezinha do interior americana. Com medo de ser descoberto e sem ter muito para onde fugir, Sonic se abriga na casa do oficial de policia local, Tom Wachowski (James Mardsen), onde uma confusão faz com que o ouriço perca seus anéis mágicos, e, claro, o bondoso e gentil policial resolve ajudá-lo a recuperá-los. Daí o narrativa passa rapidamente pelo gênero road movie e termina com uma trama previsível sobre o Poder Da Amizade Resolvendo Tudo™.

Mesmo tendo genérico carimbado em todo lugar, o filme se sustenta (e muito bem) em três alicerces que foram muito bem construídos: no carisma do personagem principal, na química dele com o policial interpretado (de maneira surpreendentemente competente) por Mardsen e na atuação (mais “jimcarreysca” impossível) de Jim Carrey. E vamos dar e este último item o destaque que ele merece – o veterano de esnobadas do Oscar está soltinho aqui, muito à vontade e no personagem e se divertindo horrores. Carrey rouba todas as cenas em que aparece e entrega um Robotnik como uma intensidade e carisma difícil de imaginar na pele de qualquer outro ator.

Apesar do roteiro frequentemente não fazer nenhum sentido (não que precisasse, afinal), ele entrega boas cenas e uma gostosa dose de humor através de vários momentos divertidinhos e alguns belos easter eggs para quem conhece e já é fã dos games. Esses, em particular, não se decepcionarão – o filme é bem fiel à lore do personagem (sim, inclusive ele já interagiu com a sociedade humana antes, em jogos como Sonic Adventura 2 e Sonic Unleashed) e as pequenas referências (em particular, uma excelente cena pós-créditos) trarão um aconchegante sentimento de nostalgia até ao gamer mais durão.

No final das contas, o saldo é positivo. “Sonic, o Filme” é diversão certa para (quase) todos os públicos (*). Só lembre de deixar o cérebro na porta do cinema.

*exceto os hipsters


Uma frase: – Sonic: “Onde eu estou? Que ano é esse? The Rock é presidente?”

Uma cena: A briga de bar, quando vemos Sonic usando seus poderes supersônicos da perspectiva dele.

Uma curiosidade: O que atraiu Jim Carrey para o projeto mais do que tudo foi que sua filha era uma grande fã dos jogos do Sonic.


Sonic: O Filme (Sonic the Hedgehog)

Direção: Jeff Fowler
Roteiro:
Pat Casey e Josh Miller
Elenco: James Marsden, Ben Schwartz, Tika Sumpter e Jim Carrey
Gênero: Ação, Aventura, Comédia
Ano: 2019
Duração: 99 minutos

Dario Lima

Dario Lima, além de ser faixa branca em todas as artes marciais e modalidades de combate conhecidas pelo homem, é também formado em Cinema. Mas sua verdadeira paixão são os joguinhos eletrônicos, desde que ganhou um Atari de presente do pai em uma época longínqua em que Menudo tocava nas rádios, Chevette era carro de playboy e McGyver passava na TV nas manhãs de domingo. Escreve sobre games na POCILGA e de vez em quando perturba os outros em algum episódio do Varacast.

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