Maratona Star Wars | Episódio V – O Império Contra-Ataca

Maratona Star Wars | Episódio V – O Império Contra-Ataca

Por quê o O Império Contra-Ataca (1980) é melhor filme de toda a saga Star Wars? Essa é uma pergunta que não é fácil de responder.

Após o estrondoso sucesso do episódio IV, em 77, George Lucas decidiu que se ocuparia apenas da produção executiva de sua saga. Para trabalhar a história original que ele havia desenhado quando da criação do primeiro filme ele convidou o excepcional roteirista Lawrence Kasdan. E para a direção o competente Irvin Kershner. E foi graças a essa combinação de fatores que O Império Contra-Ataca se tornou o melhor filme da saga Star Wars. Talvez um dos melhores filmes do gênero feitos até hoje.

George Lucas teve seus momentos de glória como diretor com os seus THX 1138 e American Grafitti, que lhes permitiram levar seu ambicioso projeto Guerra nas Estrelas aos cinemas, mas depois dali, como sabemos hoje, jamais obteve sucesso outra vez como diretor. Era um produtor e criador genial, mas como diretor, deixava bastante a desejar. Pelo menos para tocar em frente, com o fôlego que se exigia, uma saga da estatura que ele havia criado. Assim a escolha de um diretor como Kershner foi a melhor coisa que Lucas poderia ter feito para o bem de sua saga. Talvez, se ele tivesse dirigido o segundo filme das trilogia, Star Wars não viesse a ser o imenso sucesso que é.

ESB-set-photos-004Deixando o comando do filme, mas não da produção.

Kershner era um diretor sem brilho, que havia dirigido alguns filmes de pouco destaque, mas que havia dedicado a maior parte da sua carreira à TV. Tinha recebido apenas uma indicação menor a premiação pelo filme Resgate Fantástico (1976). Mas longe de ser algo ruim isso era extremamente positivo. Kershner, como se pode perceber, era o que se chama de diretor de carreira. Não um jovem cheio de idéias e teorias formado em uma faculdade de cinema, mas um profissional de longa data que havia aprendido na prática da indústria da teledramaturgia desde 1953. Nada de errado em ser um jovem genial e cheio de idéias. Mas a verdade é que a segunda parte da trilogia necessitava de uma mão firme para conduzi-la, sob pena de naufragar.

Isso porque não é fácil fazer continuações. Hollywood sempre soube disso, e também sempre soube como vitimar esse tipo de produção em busca do lucro fácil. Bastava repetir a fórmula do primeiro, que havia sido um sucesso, e os cinemas lotariam, costumavam pensar os executivos. Mas isso também produzia, costumeiramente, um resultado cinematográfico pífio, que acabava por enterrar a franquia. Lucas, como bom produtor, sabia bem disso. Ele sabia também que história queria contar na segunda – ou quinta – parte de seu épico espacial. Ele tinha uma ideia do arco narrativo de seus personagens, e da posição que esse filme ocuparia em sua trilogia, e isso deixava tudo ainda mais delicado.

ESB-009O eterno embate entre a luz e as trevas.

O Império Contra-Ataca é, afinal, o meio da jornada do herói. E o ponto mais delicado dessa narrativa. É o ponto onde conflitos se acentuam, novos problemas surgem, o vilão revela sua verdadeira face, o herói avança em seu processo de amadurecimento e deve fracassar, para só assim conseguir enfim crescer. É quando o palco se arma para a grande conclusão que virá no terceiro ato; e a conclusão de uma narrativa épica é apenas tão boa quanto a sua preparação prévia, o segundo ato, lhe permite ser.

ESB-006Um inimigo sempre um passo a frente.

Assim, nesse segundo ato, questionamentos previamente levantados precisavam ser, ainda que parcialmente, respondidos. Revelações dolorosas deveriam ser feitas. Novos personagens precisavam ser introduzidos. E acima de tudo, os heróis deveriam sofrer duramente, para que seu triunfo final pudesse vir a ser ainda mais grandioso. Em nada se assemelharia assim, ao tom alegre e luminoso que fizera do episódio IV um sucesso. O episódio V seria duro e sombrio, e tanto Hollywood quanto o gênero não estavam acostumados a isso.

ESB-012…e a vitória dos vilões.

Para ter sucesso nessa empreitada Lucas sabia que não precisava apenas de um diretor experiente. Era preciso também um excelente roteiro. Um que fosse capaz de seguir a estrutura que o meio da jornada do herói exige, com o devido aprofundamento que o rico universo de Star Wars propiciava e a narrativa épica exigia. Seu herói, Luke Skywalker, já havia amadurecido muito desde o garoto de fazenda inocente do episódio IV, e agora é um líder entre os rebeldes, como fica bem claro desde os créditos de abertura. Mas ainda faltava muito para ele amadurecer e se tornar o herói que, todos nós acreditássemos, fosse capaz de salvar toda uma Galáxia.

ESB-set-photos-002Kershner, o produtor Gary Kurtz, Lucas e Lawrence Kasdan

A construção de um épico

Lucas havia contratado a veterana escritora e roteirista Leigh Brackett para fazer o tratamento inicial para roteiro de sua história original. Mas em 1978 Brackett faleceu de câncer, e foi quando o então pouco conhecido Lawrence Kasdan entrou no projeto. Não se sabe ao certo em que medida o roteiro final que foi produzido teve mais influência de Brackett ou Kasdan. É certo que Kasdan depois disso se mostrou um roteirista talentoso, produzindo textos de grande sucesso como Caçadores da Arca Perdida e Turista Acidental e o próprio Retorno do Jedi. Sem dúvida alguma, o talento de Kasdan para bons diálogos e um tratamento mais humano dos personagens enriqueceu muito a série.

Acredito que o grande mérito dos roteiristas nesse caso foi mesmo um profundo conhecimento da estrutura narrativa mais apropriada a contar uma parte tão delicada da jornada do herói. Mas bons diálogos que captassem a essência desse roteiro que tratava de temas tão diversos e complexos eram também essenciais. Cenas emblemáticas como a da mais famosa revelação de paternidade da história da cinema, provavelmente, teriam um tom muito menos profundo e talvez até risível, se não fosse por um bom roteiro. Também não há nenhum outro filme da série que consegue sintetizar tão bem a essência de um mestre Jedi, da natureza da Força e do que de fato significa ser um cavaleiro Jedi, quanto O Império Contra-Ataca. E isso sem dúvida chega ao público através simplesmente das inúmeras célebres frases proferidas pelo Mestre Yoda.

ESB-002A representação máxima do mestre zen das artes marciais.

A propósito, outro ponto que merece destaque são todas as excelentes cenas com Yoda. Além sempre importante direção de Irvin Kershner, temos ali a magia de Jim Henson, que praticamente deu vida a um boneco animatrônico, juntamente com a excelente interpretação de Frank Oz. Em uma época na qual captura de movimentos não existia e uma boa interpretação de um animatrônico dependia em muito da sintonia entre inflexão de voz e manipulação do titereiro, a ação conjunta de Oz e Henson para dar vida à Yoda é sem dúvida sem precedentes e até hoje incomparável.

ESB-set-photos-001A equipe de Jim Henson e Irvin Kershner.

Nesse episódio também conhecemos mais sobre o grande vilão da série, Darth Vader, e vemos pela primeira vez um vestígio de sua humanidade. Era preciso também humanizar, na medida dos possível, os vilões, para que a grande revelação do final desse filme pudesse fazer mais sentido. Não fosse Vader mostrado como alguém que perdeu sua humanidade no momento apropriado e com a sutileza precisa que as cenas que assim o fazem possuem, crer que aquele ser de armadura negra pudesse ser de fato o pai de Luke Skywalker talvez soasse para a audiência como absolutamente inverossímil.

ESB-013Pokebola Darth Vader

O valor de um bom diretor

É claro que o mérito de todo o sucesso de cada uma dessas cenas, com excelentes diálogos, não deve residir apenas no roteiro. Quem conhece cinema bem sabe que o roteiro é muito mais um parâmetro inicial que apenas ganha a forma apropriada nas mãos de um bom diretor. Sem dúvida alguma a direção de Kershner foi instrumental para que o roteiro de Kasdan e Brackett ganhasse vida.

Há inclusive uma famosa anedota envolvendo a produção que é bastante emblemática da relevância que a direção de Kershner teve no resultado final. Conta-se que na cena em que Han está prestes a ser congelado em carbonita, na qual Leia revela enfim seu amor a ele, pelo roteiro original o segundo “canalha” mais carismático da Galáxia deveria replicar apenas com um básico “Eu também”. Após filmar dezenas de tomadas da mesma cena, Kershner seguia incomodado com o resultado final. Algo, para ele, não fazia sentido ali.

ESB-set-photos-003Direção de atores de primeira qualidade.

Em uma solução simples que revela muito de sua habilidade para dirigir atores Kershner simplesmente sugeriu Harrison Ford que ignorasse o roteiro e falasse o que ele acreditava que o personagem dele falaria. E daí, imediatamente, no take seguinte, o fantástico “Eu sei”, em resposta à declaração de amor da personagem de Carrie Fisher enfim chegou às telonas, em uma das cenas mais emocionantes e que melhor definem um personagem em toda a saga. A direção de Kershner, pode-se dizer, deu vida e profundidade a personagens que haviam sido apenas superficialmente apresentados no episódio IV.

Mas a habilidade de Kershner não se resume a uma ótima direção de atores. Como o episódio V é um filme anti-climático por excelência, não convinha encerrá-lo em uma grande batalha. Mas a sequência de luta em Hoth logo nos primeiros minutos de filme é sem dúvida uma das melhores aberturas que o cinema já produziu. Talvez a melhor do gênero.

ESB-003Ecos de uma Guerra jamais esquecida…

Nas cenas de Hoth conseguimos ter a real sensação de uma guerra, no sentido original que Lucas imaginou evocar desde o princípio. Muito do que vemos em Star Wars, afinal, é uma clara alegoria da II Guerra Mundial com o Império representando as potências do Eixo e a Aliança Rebelde os Aliados. Isso é bastante evidente nos figurinos dos oficiais imperiais e até mesmo no nome Stormtroopers, que era como tropas de infantaria especiais alemãs da I Guerra Mundial eram chamadas. Na batalha de Hoth vemos pela primeira vez os assustadores AT-AT Walkers que simbolizam os famoso tanques de guerra nazistas que encheram os dias e noites dos aliados de terror e pesadelos respectivamente.

A forma com a qual Kershner conduz toda essa sequência dá o tom do filme desde o início. O Império está contra-atacando. De maneira inclemente e devastadora. E quando uma força como o Império decide avançar, é melhor fugir por suas vidas. Não por acaso todo o filme é uma sequência direta da batalha de Hoth. Todo o filme, de maneira muito simples, se resume a uma fuga desesperada de Han, Leia, Chewie e C3PO das tropas imperiais lideradas por um Darth Vader obcecado por encontrar Luke. Enquanto Luke aproveita a deixa para ir para Dagobah, seguindo a orientação do espírito de Obi-Wan, que o mandou encontrar o velho mestre Jedi que deveria completar seu treinamento.

ESB-001On the run!

Nisso, a propósito, o roteiro funciona muito bem, ficando evidente que, não fosse por Han e Leia, inadvertidamente, despistarem Vader por tanto tempo, Luke jamais conseguiria ter avançado muito em seu treinamento Jedi. Treinamento esse que, como sabemos, é peça fundamental em sua jornada do herói e sem a qual o enredo do Retorno do Jedi jamais poderia existir.

ESB-011O Caminho do Jedi passa por carregar seu mestre nas costas…

Kershner também é muito habilidoso ao conduzir duas narrativas paralelas que, se observarmos detidamente, evidentemente deveriam transcorrer em espaços de tempo muito distintos. O treinamento de Luke, se formos razoáveis, deve ter levado algumas semanas, enquanto que a perseguição à Millenium Falcon, convenhamos, não pode ter tomado mais do que alguns dias. Mas Kershner conduz essas narrativas com tamanha habilidade e sutileza, sem entrar em detalhes cronológicos precisos, que somos totalmente envolvidos pela história e em momento algum nos incomodamos com aquelas aparentes disparidades.

ESB-007Corno Carbonita?…

O filme ainda conta com cenários fantásticos como as já citadas Hoth e Dagobah, e Bespin, a cidade mineradora nas nuvens, na qual somos apresentados ao mais carismático de todos os canalhas, Lando Calrisian (Billy Dee Williams), que com seu sorriso engana até mesmo o desconfiado e experiente Han Solo. Tem ainda os excelentes efeitos visuais e de som que são característicos da saga Guerra nas Estrelas e a magistral trilha sonora de John Williams, que conseguiu fazer com que a Marcha Imperial, no imaginário de toda uma geração, ocupasse o mesmo espaço de uma Marcha Fúnebre ou do Réquiem de Mozart.

ESB-008E tem também Boba Fett! (Apesar de que ninguém sabia bem quem ele era, até então…)

Enfim, um épico do cinema!

Claro que essas são apenas partes que formam um todo. Analisadas separadamente elas fazem todo o sentido. Mas não seria suficiente para explicar a dimensão de sucesso que O Império Contra-Ataca conseguiu tanto em público quanto em crítica, colocando-o, a despeito de debates de posição com o Retorno do Jedi, como muito provavelmente o melhor filme de toda a franquia, e talvez um dos melhores filmes que o gênero já produziu. Talvez apenas a Força possa explicar a magnitude dessa obra.

ESB-014Embates épicos…

O certo é que O Império Contra-Ataca ajudou a garantir o espaço e a sobrevida da franquia mais amada da Galáxia na história do cinema. Se Star Wars – Uma Nova Esperança, foi um marco no cinema, a sua sequência afirmou definitivamente essa conquista e garantiu que aquele marco se transformasse em um mudança de toda a forma de uma indústria fazer negócio.

ESB-015…escapadas audaciosas.

Afinal, sem ao menos uma competente segunda parte, todo o futuro da franquia – e da importância que a própria ideia de franquias passou a ter para o cinema desde então – seria totalmente comprometido. Star Wars seria apenas mais uma grande promessa, com grande potencial, que não soube se sustentar. O Império Contra-Ataca, enfim, permitiu que a saga da família Skywalker chegasse ao seu destino merecidamente grandioso, garantindo a criação de um dos maiores épicos da história do cinema.

ESB-010A saga da família Skywalker.

Que a Força esteja com você.



Título Original: Star Wars: Episode V – The Empire Strikes Back
Título Nacional: O Império Contra-Ataca
Gênero: Ação/Aventura/Fantasia
Ano: 1980
Duração: 124 min
Diretor: Irvin Kershner
Roteiro: Leigh Brackett e Lawrence Kasdan
Elenco: Mark Hamill, Harrison Ford, Carrie FisherAnthony DanielsDavid Prowse, Peter Mayhew, Kenny Baker, Frank Oz, Alec Guinness, James Earl Jones  e Billy Dee Williams.
Graus de Kevin Bacon: 2Billy Dee Williams atuou em Rocky II: A Revanche (1979) ao lado de Paul McCrane que esteve em Beyond All Boundaries (2009) com Kevin Bacon.


Mário Bastos

Quadrinista e escritor frustrado (como vocês bem sabem esses são os "melhores" críticos). Amante de histórias de ficção histórica, ficção científica e fantasia, gostaria de escrever como Neil Gaiman, Grant Morrison, Bernard Cornwell ou Alan Moore, mas tudo que consegue fazer mesmo é mestrar RPG para seus amigos nerds há mais de vinte anos. Nas horas vagas é filósofo e professor.

7 comentários sobre “Maratona Star Wars | Episódio V – O Império Contra-Ataca

  1. Lando sendo Lando e Yoda o mochila de criança. Gostei das imagens e piadinhas na legenda, seu texto define muito bem o que é esta obra prima.

    Engraçado que Keshner não dirigiu tantos outros filmes, mas só bastava este mesmo na carreira de uma pessoa.

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